O entendimento sobre a figura do segurado aluno aprendiz exige uma visão intertemporal da legislação previdenciária, bem como um domínio dos posicionamentos jurisprudenciais. Neste artigo, o leitor poderá assimilar esse entendimento de forma rápida e objetiva.
No governo de Getúlio Vargas, o Brasil passou por significativas mudanças em seu projeto educacional, destacando-se a publicação da Lei nº 4.073/1942 (Lei Orgânica do Ensino Industrial), que ampliou e reorganizou o ensino técnico com a finalidade de expansão industrial através da capacitação de crianças e adolescentes.
Os alunos das escolas técnicas, também denominados “alunos aprendizes”, recebiam formação escolar em conjunto com prática profissional supervisionada. Esse período exercido como aluno aprendiz pode ser computado como tempo de contribuição para fins previdenciários?
Para melhor elucidação do tema, seus principais pontos foram compilados abaixo através de uma análise de sua previsão legal, normativa, bem como o entendimento jurisprudencial sobre o tema.
1) Previsão de cômputo do “aluno aprendiz” no Decreto nº 3.048/99
Nos termos do art. 188-G do Decreto nº 3.048/99, inserido pelo Decreto nº 10.410/2020, é considerado como tempo de contribuição “o tempo exercido na condição de aluno-aprendiz referente ao período de aprendizado profissional realizado em escola técnica, desde que comprovados a remuneração pelo erário, mesmo que indireta, e o vínculo empregatício”.
2) Previsão de cômputo do “aluno aprendiz” na IN nº 128/2022
No âmbito administrativo, a IN nº 128/2022 estabelece que os períodos de aprendizado profissional realizados até 16/12/1998 serão considerados como tempo de serviço/contribuição, independente do momento em que o segurado venha a implementar os demais requisitos para a concessão de aposentadoria, podendo ser contados:
II) o tempo de aprendizado profissional realizado como aluno aprendiz em escolas industriais ou técnicas, com base na Lei Orgânica do Ensino Industrial (Lei nº 4.073/1942);
III) os períodos de frequência em escolas industriais ou técnicas, inclusive escolas e colégios agrícolas, da rede de ensino federal, escolas equiparadas ou reconhecidas, desde que tenha havido retribuição pecuniária à conta do orçamento respectivo do Ente Federativo, ainda que fornecida de maneira indireta ao aluno (art. 135, IN nº 128/2022).
Especificamente com relação à comprovação da frequência, a Autarquia Previdenciária exige a apresentação dos seguintes documentos:
II) Quando se tratar de escolas industriais ou técnicas: certidão escolar constando que o estabelecido era reconhecido e mantido por empresa de iniciativa privada, que o curso foi efetivado sob seu patrocínio ou que o curso de aprendizado nos estabelecimentos oficiais ou congêneres foi ministrado mediante entendimentos com as entidades interessadas;
III) Quando se tratar de escolas industriais ou técnicas da rede federal ou equiparadas (entes estaduais, distritais ou municipais): certidão de tempo de contribuição – CTC (art. 137 da IN nº 128/2022).
Assim, o entendimento administrativo é no sentido de que o tempo de aluno aprendiz somente poderá ser considerado como tempo de contribuição se comprovada a remuneração e o vínculo empregatício através de frequência, valores recebidos a título de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros, entre outros, devendo ser apresentada certidão para comprovação do vínculo (art. 136, IN nº 128/2022).
3) Jurisprudência do STF
Em âmbito judicial, o STF entende que o aluno-aprendiz será considerado como segurado empregado, desde que perceba remuneração, mesmo que indireta. A esse propósito, destaca-se:
4) Súmula nº 96 do Tribunal de Contas da União (TCU) e Súmula 24 da Advocacia Geral da União (AGU)
No mesmo sentido do entendimento do STF, a Súmula 96 do TCU assim estabelece:
Seguindo esse posicionamento, também merece destaque a Súmula 24 da AGU:
5) Jurisprudência do STJ
O STJ, em consonância com a Súmula nº 96 do TCU e com o já exposto acima, entende que é possível o cômputo do tempo de estudante como aluno aprendiz de escola pública profissional para complementação de tempo de serviço, desde que preenchidos os requisitos da comprovação do vínculo empregatício e da remuneração à conta do orçamento da União. Nesse sentido:
6) Tema 216 da TNU
O cômputo do período como aluno-aprendiz foi revisitado pela TNU em Tema 216, julgado em 14/02/2020. O cerne da discussão era saber se, para o cômputo do tempo de estudante como aluno-aprendiz de escola pública profissional, objetivando fins previdenciários, exige-se além da remuneração, mesmo que indireta, a comprovação da presença de algum outro requisito em relação à execução do ofício para o qual recebia a instrução.
A Súmula 18 da TNU, em sua redação original, publicada em 07/10/2004, assim estabelecia:
Por sua vez, a jurisprudência do STJ, em ambas as Turmas de Direito Público, apontava para a necessidade de observância dos requisitos estampados na redação original da Súmula 96 do TCU, quais sejam, a exigência de comprovação do vínculo empregatício e remuneração à conta do orçamento da União.
Diante disso, a TNU concluiu que, para fins previdenciários, o cômputo do tempo de serviço prestado como aluno-aprendiz exige a comprovação de que, durante o período de aprendizado, houve simultaneamente: (i) retribuição consubstanciada em prestação pecuniária ou em auxílios materiais; (ii) à conta do Orçamento; (iii) a título de contraprestação por labor; (iv) na execução de bens e serviços destinados a terceiros, alterando-se a redação da Súmula 18.
Portanto, o entendimento judicial atual, alinhado com o administrativo, é de que, para o cômputo do período de aluno aprendiz como tempo de contribuição, a atividade deve ter sido desempenhada na execução de bens e serviços destinados a terceiros, além da remuneração em pecúnia ou auxílios materiais à conta do orçamento público à título de contraprestação do labor.
Por fim, ressalta-se que os entendimentos administrativo e judicial também se alinham no sentido de que a certidão para reconhecimento do período como aluno aprendiz somente contemplará os dias letivos, isto é, excluindo os dias de férias e não úteis.
Se cumpridos os requisitos para o seu cômputo, o tempo exercido como aluno aprendiz poderá ser determinante para o preenchimento dos requisitos para a obtenção de aposentadoria, devendo ser analisado pelos advogados previdenciaristas.
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Texto produzido por Fernanda Dornelas Carvalho. Advogada e pós-graduanda em Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e em Direito Previdenciário Militar.
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