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30 de janeiro de 2024

A “execução invertida” como faculdade da fazenda pública (INSS)

Em grande parte, o INSS adota o procedimento da execução invertida para apresentar os cálculos no cumprimento de sentença. Contudo, não deve ser imposta multa ou qualquer outra sansão prévia ou posterior pelo não atendimento deste costume.

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, firmou entendimento no Agravo em Recurso Especial (Processo nº AREsp 2.014.491-RJ – Julgamento 12/12/2023), com relatoria do Ministro Herman Benjamin, de que não cabe medida impositiva à Fazenda Pública para promover a execução invertida no cumprimento espontâneo da obrigação oriunda da decisão com trânsito em julgado.

O procedimento de construção jurisprudencial da “execução invertida” deve ser pautado pelo princípio processual da cooperação, sendo que tal prática não deve ser entendida como um dever legal do ente público, o que poderia ensejar medidas punitivas pelo o seu não atendimento.

Segundo Informativo nº 799, de 19/12/2023, a controvérsia foi instaurada para definir se é possível a determinação judicial à Fazenda Pública, de adoção da prática jurisprudencial da execução invertida no cumprimento de sentença, com a consequente apresentação de demonstrativo de cálculos e valores a serem pagos.

Por muitas vezes o INSS é intimado do trânsito em julgado da sentença ou, quando for o caso, do retorno dos autos à primeira instância, para promover o cumprimento espontâneo da obrigação, o que consiste em alguns casos na apresentação de planilha de cálculos com os valores pretéritos devidamente discriminados e atualizados.

O procedimento denominado “execução invertida” consiste na modificação do rito processual estabelecido no Código de Processo Civil, ofertando à parte executada (devedor) a possibilidade de apresentação dos cálculos e valor devido à parte exequente (credor). Não há previsão legal de tal mecanismo processual, sendo ele uma construção jurisprudencial.

“No âmbito do STJ, em observância mesmo aos princípios do CPC, a construção jurisprudencial da “execução invertida” tem como fundamento basilar a “conduta espontânea” do devedor. Para tanto, tal espontaneidade e voluntariedade em antecipar-se na apresentação dos cálculos da execução, e por decorrência, acelerar o processo atendendo deste modo outro princípio processual (tempo razoável do processo), gera a recompensa da não condenação em honorários advocatícios”.

A técnica processual acima possui relevância e legitimidade nas causas previdenciárias, notadamente aquelas em curso nos Juizados Especiais.

Tanto assim que o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 219, disciplinou:

    ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL – ADEQUAÇÃO.
    Cumpre ao Supremo, ante o objetivo da ação nobre que é a de descumprimento de preceito fundamental, o implemento de visão interpretativa generosa, contribuindo para a eficácia do Direito, a racionalização dos trabalhos judiciários, alfim, a manutenção da paz social.
    JUIZADOS ESPECIAIS – EXECUÇÃO – CÁLCULOS.
    A interpretação teleológico-sistemática da ordem jurídica, calcada na Constituição Federal como documento maior da República, conduz a placitar-se a óptica segundo a qual incumbe ao órgão da Administração Pública acionado, à pessoa jurídica de direito público, apresentar os cálculos indispensáveis à solução rápida e definitiva da controvérsia, prevalecendo o interesse primário – da sociedade – e não o secundário – o econômico da Fazenda Pública. Os interesses secundários não são atendíveis senão quando coincidirem com os primários, únicos que podem ser perseguidos por quem axiomaticamente os encara e representa – Celso Antônio Bandeira de Mello – Curso de Direito Administrativo 2010, página 23. (ADPF 219, Relator(a): Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 20/5/2021, Processo eletrônico DJe-200 divulg. 6-10-2021 public. 7-10-2021).

“Conquanto abrangente, por tratar-se de ação constitucional, o precedente acima possui nuanças próprias, dentre as quais os próprios limites de aplicabilidade do precedente jurisprudencial: decisões proferidas pelos Juizados Especiais.

Nesse contexto, em que pese a importância e realce dos princípios que regem o microssistema dos juizados especiais, não há possibilidade de imposição automática de tais princípios, e por decorrência seus efeitos, para o âmbito dos processos ordinários (comuns). No campo do processo civil, ordenado pelo Código de Processo Civil, outros princípios e vetores de julgamento sobressaem, como por exemplo: princípio da cooperação e comportamento processual probo (boa-fé).

No caso em exame, o Tribunal a quo deveria ter intimado previamente a parte executada ofertando-lhe a possibilidade de cumprimento espontâneo da sentença. Caberia então a parte decidir pela apresentação ou não dos cálculos e valores devidos. Não o fazendo, assumiria por sua conta própria a responsabilidade da condenação em honorários advocatícios, decorrentes da execução (princípio da causalidade) Tal procedimento prévio de intimação da Fazenda Pública possui substrato na jurisprudência do STJ.

Recomendável, deveras, que a Fazenda Pública adotasse, principalmente na seara previdenciária, o procedimento de antecipação voluntária na demonstração dos cálculos para execução. Desse modo, cumpriria o princípio da celeridade processual, bem como se desvencilharia de custos para o erário com condenações em honorários advocatícios (princípio da causalidade). Contudo, repita-se, tal procedimento, com base na jurisprudência do STJ, possui a característica primordial da espontaneidade da parte executada, não cabendo imposições cogentes da autoridade judicial”.

Texto retirado do Informativo 799 do STJ.

Bruno Valente Ribeiro, coordenador do Portal OGuiaPrevidenciário, professor de direito previdenciário e Procurador Federal (AGU).

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