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6 de maio de 2022

Alterações promovidas pela Lei 14.331/2022 na legislação previdenciária

A Lei nº 14.331, de 04 de maio de 2022, trouxe algumas modificações na legislação previdenciária quanto ao pagamento de honorários periciais, quanto aos requisitos da petição inicial em litígios e em medidas cautelares relativos a benefícios assistenciais e previdenciários por incapacidade e sobre a criação da regra do divisor mínimo na concessão de aposentadorias não incapacitantes do RGPS, o que gerou a extinção de uma estratégia previdenciária para geração superaposentadorias conhecida como “milagre da contribuição única”.

A legislação previdenciária sempre foi conhecida pela sua constante modificação.

A normatização que regula o sistema de previdência social precisa se manter adequada e alinhada ao contexto da sociedade que permanece continuamente em transformação.

Contudo, nos últimos tempos, as mudanças estão acontecendo em ritmo cada vez mais acelerado.

Isso, sem falar das modificações da interpretação da legislação previdenciária a partir da atuação do poder judiciário.

No último dia 04 de maio, foi sancionada nova lei que trouxe modificações para a sistemática de pagamento de honorários periciais no âmbito dos processos judiciais e novas exigências para as petições iniciais em litígios e em medidas cautelares relativos a benefícios assistenciais e previdenciários por incapacidade.

A Lei nº 14.331, de 4 de maio de 2022, foi editada principalmente com a finalidade de criar um ambiente financeiramente mais estável para o custeio das perícias judiciais nos processo em que o INSS é parte.

Não é de hoje que existem problemas no financiamento das perícias médicas e socioeconômicas nos processos de benefício por incapacidade ou benefícios assistenciais (BPC/LOAS). Diversos médicos e assistentes sociais que atuam como peritos na justiça precisam, muitas vezes, aguardar longos períodos para que os recursos seja disponibilizados para o pagamento das suas atividades judiciais. Muitos deles dizer que “tem que fazer caixa” e aguentar o período sem provisão de financiamento das perícias. Por exemplo, desde setembro de 2021, em razão do vencimento do prazo estabelecida pela Lei 13.876/2019, o pagamento das perícias judiciais está paralisado.

A nova lei alterou dispositivos da Lei nº 13.876, de 20 de setembro de 2019 e da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, para dispor sobre o pagamento de honorários periciais em ações que discutam a concessão de benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou de benefícios previdenciários por incapacidade e sobre os requisitos da petição inicial em litígios e em medidas cautelares relativos a benefícios por incapacidade.

A premissa trazida pela lei é impactante, pois determina que “o ônus pelos encargos relativos ao pagamento dos honorários periciais ficará a cargo da parte vencida no processo”.

Certamente, isso não modifica em nada o contexto da assistência judiciária gratuita que dispensa a parte hipossuficiente do ônus da sucumbência.

Esta regra se aplica aos processo que tramitam na justiça federal e também àqueles da justiça estadual no exercício da competência delegada.

Essa medida atribuída ao vencido não modifica a responsabilidade do réu em antecipar o pagamento da perícia judicial. A única exceção se aplica a parte que comprovadamente disponha de condição suficiente para arcar com os custos de antecipação das despesas referentes às perícias médicas judiciais, ocasião em que deverá antecipar os custos dos encargos relativos ao pagamento dos honorários periciais.

Na antecipação dos recursos para o financiamento da perícias judiciais, o Poder Executivo Federal atuará da seguinte maneira:

I – nas ações de competência da Justiça Federal, incluídas as que tramitem na Justiça Estadual por delegação de competência, as dotações orçamentárias para o pagamento de honorários periciais serão descentralizadas pelo órgão central do Sistema de Administração Financeira Federal ao Conselho da Justiça Federal, que se incumbirá de descentralizá-las aos Tribunais Regionais Federais, os quais repassarão os valores aos peritos judiciais após o cumprimento de seu múnus, independentemente do resultado ou da duração da ação, vedada a destinação desses recursos para outros fins;

II – nas ações de acidente do trabalho, de competência da Justiça Estadual, os honorários periciais serão antecipados pelo INSS.

As despesas com as perícias judiciais ficam condicionadas à expressa autorização física e financeira na lei orçamentária anual das despesas decorrentes.

Além destas regras para o pagamento das perícias judiciais, a Lei nº 14.331/2022 incluiu o artigo 129-A na Lei nº 8.213/91 que estabelece novos requisitos para a petição inicial em litígios e em medidas cautelares relativos a benefícios por incapacidade.

O dispositivo determina que “em complemento aos requisitos previstos no art. 319 do CPC”, a petição inicial de ações de todos os ritos e medidas cautelares relativas aos benefícios por incapacidade deverá observar os seguintes regramentos:

    I – quando o fundamento da ação for a discussão de ato praticado pela perícia médica federal, a petição inicial deverá conter:

    a) descrição clara da doença e das limitações que ela impõe;

    b) indicação da atividade para a qual o autor alega estar incapacitado;

    c) possíveis inconsistências da avaliação médico-pericial discutida; e

    d) declaração quanto à existência de ação judicial anterior com o objeto de que trata este artigo, esclarecendo os motivos pelos quais se entende não haver litispendência ou coisa julgada, quando for o caso;

    II – para atendimento do disposto no art. 320 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), a petição inicial, qualquer que seja o rito ou procedimento adotado, deverá ser instruída pelo autor com os seguintes documentos:

    a) comprovante de indeferimento do benefício ou de sua não prorrogação, quando for o caso, pela administração pública;

    b) comprovante da ocorrência do acidente de qualquer natureza ou do acidente do trabalho, sempre que houver um acidente apontado como causa da incapacidade;

    c) documentação médica de que dispuser relativa à doença alegada como a causa da incapacidade discutida na via administrativa.

    § 1º Determinada pelo juízo a realização de exame médico-pericial por perito do juízo, este deverá, no caso de divergência com as conclusões do laudo administrativo, indicar em seu laudo de forma fundamentada as razões técnicas e científicas que amparam o dissenso, especialmente no que se refere à comprovação da incapacidade, sua data de início e a sua correlação com a atividade laboral do periciando.

    § 2º Quando a conclusão do exame médico pericial realizado por perito designado pelo juízo mantiver o resultado da decisão proferida pela perícia realizada na via administrativa, poderá o juízo, após a oitiva da parte autora, julgar improcedente o pedido.

    § 3º Se a controvérsia versar sobre outros pontos além do que exige exame médico-pericial, observado o disposto no § 1º deste artigo, o juízo dará seguimento ao processo, com a citação do réu.”

A norma também adota como regra a inversão do rito processual com a realização da perícia médica antes da citação do INSS.

Por fim, a Lei nº 14.331/2022 ainda incluiu o artigo 135-A na Lei nº 8.213/91 para acabar com a possibilidade do “milagre da contribuição única” a partir da criação de um divisor mínimo na concessão das aposentadorias do RGPS, com exceção das aposentadorias por incapacidade permanente.

Assim determina o artigo 135-A:

    “Para o segurado filiado à Previdência Social até julho de 1994, no cálculo do salário de benefício das aposentadorias, exceto a aposentadoria por incapacidade permanente, o divisor considerado no cálculo da média dos salários de contribuição não poderá ser inferior a 108 (cento e oito) meses.”

Isso impede que o segurado utilize de período de carência anterior a julho de 1994 e compute apenas uma contribuição (geralmente no teto do INSS) no período posterior a 07/1994 para o cálculo do benefício. A aposentadoria com base no milagre da contribuição única foi uma estratégia que permitiu aumentar o valor de uma aposentadoria, muitas vezes, de 1 salário mínimo para 60% do teto do INSS com apenas 1 contribuição para o INSS.

Isso passou a ser possível com a Emenda Constitucional nº 103/2019 que, aliada à redação do Decreto nº 10.410/2020 (artigo 188-E), extinguiu o divisor mínimo para as novas aposentadorias e a mudança constitucional ainda possibilitou ao segurado a exclusão de contribuições do período básico de cálculo.

Conforme § 6º do artigo 26 da EC nº 103/2019:

    § 6º Poderão ser excluídas da média as contribuições que resultem em redução do valor do benefício, desde que mantido o tempo mínimo de contribuição exigido, vedada a utilização do tempo excluído para qualquer finalidade, inclusive para o acréscimo a que se referem os §§ 2º e 5º, para a averbação em outro regime previdenciário ou para a obtenção dos proventos de inatividade das atividades de que tratam os arts. 42 e 142 da Constituição Federal.

Com essa regra, um segurado que já tinha atingido a carência e o tempo de contribuição mínimos antes de 07/1994 pode fazer apenas uma contribuição no teto do RGPS e requerer a exclusão de todas as demais contribuições posteriores a 07/1994, o que faz gerar essa superaposentadoria com base no que ficou conhecido como “milagre da contribuição única”.

Com o restabelecimento da regra do divisor mínimo pela Lei nº 14.331/2022, esta estratégia deixou de ser possível, pois o divisor mínimo exige a divisão da média das contribuições do segurado por um número determinado, no caso atual: 108 (cento e oito) meses. Na antiga redação do §2º do artigo 3º da Lei nº 9.876/99 o divisor mínimo era “sessenta por cento do período decorrido da competência julho de 1994 até a data de início do benefício, limitado a cem por cento de todo o período contributivo”.

Essas foram as alterações trazidas pela Lei nº 14.331/2022, sancionada e publicada em 04 de maio de 2022.

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Texto produzido por BRUNO VALENTE RIBEIRO, coordenador do Portal O Guia Previdenciário, professor de direito previdenciário e Procurador Federal (AGU).

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