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5 de janeiro de 2023

Análise completa da Revisão da Vida Toda

Tese firmada pelo STF: “O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”

Conforme já informado aqui no Guia Previdenciário, o Supremo Tribunal Federal – STF, ainda em plenário virtual, havia formado maioria para reconhecer como constitucional a revisão dos benefícios previdenciários conhecida como “VIDA TODA”.

Veja o que foi publicado no dia 25 de fevereiro de 2022: Revisão da Vida Toda

Ocorre que havia a possibilidade de algum dos Ministros do STF, até o término do prazo do plenário virtual (23h59 de 8 de março de 2022), utilizar de uma prerrogativa regimental e pedir vista ou um destaque, o que levaria o julgamento para o plenário físico. E foi o que ocorreu!

O Ministro Nunes Marques requereu vista do processo (destaque) e o julgamento da revisão da vida toda recomeçou em plenário físico, não gerando efeitos a decisão do plenário virtual.

Ocorre que surgiu uma polêmica, pois o Ministro Marco Aurélio acabou se aposentando e, em tese, o seu voto seria substituído pelo do Ministro André Mendonça, o que, provavelmente, reverteria a decisão e julgaria inconstitucional a tese da revisão da vida toda.

A partir deste imbrólio, foi suscitada questão de ordem, que acabou sendo julgada pelo plenário do STF no seguinte sentido:

    […] o Tribunal, por maioria, acolheu questão de ordem suscitada pelo Ministro Alexandre de Moraes no sentido de o Plenário fixar o entendimento da validade de voto proferido por Ministro posteriormente aposentado, ou cujo exercício do cargo tenha cessado por outro motivo, mesmo em caso de destaque em julgamento virtual […]

Assim, o STF no âmbito do julgado do no Recurso Extraordinário (RE) 1276977, com repercussão geral (Tema 1.102), formou maioria para acolher a tese da constitucionalidade da revisão da vida toda, inclusive fazendo remissão à Emenda Constitucional nº 103/19.

    Tese firmada pelo STF: “O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”

Mas qual o contexto hitórico para entender a tese da revisão da vida toda?

Bom, primeiramente, temos que analisar a regra de cálculo do salário-de-benefício à luz da redação original da Lei nº 8.213/91.

Assim dizia o artigo 29, caput:

    O salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao do afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses.

No caso dos benefícios que utilizavam o salário-de-beneficio como parâmetro de cálculo da renda mensal de benefício, era feita uma média dos últimos 36 salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses.

Veja que por mais extenso que fosse o histórico contributivo do segurado, o cálculo de seu benefício era estabelecido com base neste interregno final de sua vida contributiva.

Só que essa regra foi alterada pela edição da Lei 9.876, de 26/11/1999, que trouxe nova redação para o artigo 29, assim dispondo:

    Art. 29. O salário-de-benefício consiste:

    I – para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário;

    II – para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.

A nova regra passou a estabelecer que a média seria feita pelos 80% maiores salário-de-contribuição de todo o período contributivo.

Esse é o ponto central da tese da revisão da vida toda!

Mas porquê então a polêmica?

A questão controversa nasce em razão da regra de transição estabelecida no texto da Lei nº 9.876/99, nos seguintes termos:

    Art. 3º Para o segurado filiado à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação desta Lei, que vier a cumprir as condições exigidas para a concessão dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, no cálculo do salário-de-benefício será considerada a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, observado o disposto nos incisos I e II do caput do art. 29 da Lei no 8.213, de 1991, com a redação dada por esta Lei.

    § 1o (…)

    § 2o No caso das aposentadorias de que tratam as alíneas b, c e d do inciso I do art. 18, o divisor considerado no cálculo da média a que se refere o caput e o § 1o não poderá ser inferior a sessenta por cento do período decorrido da competência julho de 1994 até a data de início do benefício, limitado a cem por cento de todo o período contributivo.

Ou seja, a Lei nº 9.876/99 criou uma regra de transição para segurados filiados ao RGPS até a data de sua publicação, para que o período básico de cálculo (PBC) fosse limitado à competência Julho de 1994. Criou também para as aposentadorias não incapacitantes o chamado “divisor mínimo” para evitar a aplicação da média sobre poucos salários-de-contribuição e a apuração de uma renda mensal desproporcional.

O INSS, em suas análises administrativas, estabeleceu como regra principal a limitação do PBC à competência de Julho de 1994 e somente aplicando a regra do artigo 29 aos segurados filiados a partir da edição da Lei 9.876/99.

No entanto, a tese da revisão da vida toda visa a apuração da média de todos os salários de contribuição, incluindo as contribuições anteriores à Julho de 1994.

Com a decisão do STF, no julgamento do Tema 1.102, por maioria foi acolhida a tese constitucionalidade da revisão da vida toda, sendo destinada aos seguintes beneficiários:

– Segurado com benefício concedido nos termos da regra de transição do artigo 3º da Lei 9.876/99;

– Benefício concedido considerando as regras anteriores à Emenda Constitucional nº 103/19;

– Ato de concessão do benefício a pelo menos 10 anos, pois o prazo decandencial (artigo 103 da Lei 8.213/91) se aplica ao presente tema;

– Início da contagem do prazo decadencial é a partir do momento que o segurado recebeu a primeira parcela do benefício;

– Períodos constantes do CNIS sem o registro de salários-de-contribuição e sem documentos que comprovem o seu patamar, devem ser incluídos considerando o salário mínimo da época. Isso vale também para períodos de atividade rural reconhecidos para fins de aposentadoria híbrida.

Importante frisar que nem sempre a aplicação da tese será benéfica para o valor da renda mensal de benefício. Na realidade, na grande maioria dos casos, apura-se renda mensal inferior à apurada pelo INSS com a regra de transição.

Por isso, é de extrema importância a verificação com sistemas próprios das vantagens ou desvantagens da aplicação da revisão da vida toda, devendo ainda ser verificado com muito rigor a relação de salários-de-contribuição que constam do CNIS.

Tese firmada pelo STF:

    “O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”

Texto produzido pelo coordenador do Portal OGuiaPrevidenciário, Bruno Valente Ribeiro, professor de direito previdenciário e Procurador Federal (AGU).

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