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27 de janeiro de 2025

O fenômeno do benefício de auxílio-acidente (artigo 86, Lei nº 8.213/91)

O aumento do número de beneficiários do auxílio-acidente vem ocorrendo em razão da melhoria de registros dos acidentes, da maior divulgação de informações sobre a proteção, do processo de virtualização dos meios de requerimento, bem como da automação das rotinas de análise e da alteração dos precedentes judiciais.

Durante muito tempo, o benefício de auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei nº 8.213/91, não apresentou uma posição de destaque entre os benefícios previdenciários por incapacidade.

O desconhecimento geral em torno de suas características e seu escopo na proteção ao acidente de qualquer natureza, trouxe ao benefício de auxílio-acidente um horizonte de concessões muito limitado.

Até mesmo no âmbito judicial, nos processos em que se pleiteava um benefício por incapacidade, havia uma considerável confusão entre os benefícios de auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) decorrente de acidente do trabalho e o auxílio-acidente por acidente do trabalho.

Contudo, nos últimos tempos, tem se observado um aumento substancial das concessões do benefício de auxílio-acidente.

Antes de explicar o fenômeno, é salutar conhecer: O que é o benefício de auxílio-acidente?

O benefício de auxílio-acidente tem como finalidade indenizar o segurado (empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e segurado especial) em razão da ocorrência de um acidente de qualquer natureza e da perda parcial da capacidade para o trabalho, após a consolidação das lesões.

Os requisitos necessários à concessão do benefício de auxílio-acidente são:

a) Ocorrência do acidente de qualquer natureza;

b) Qualidade de segurado na data do acidente com enquadramento como segurado empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso ou segurado especial;

c) Após a consolidação das lesões decorrentes do acidente resultar a redução da capacidade laborativa;

d) Enquadramento no Anexo III do Decreto 3.048/99.

Deve ficar claro que este benefício não é somente concedido em casos de acidente do trabalho. Estabelece a legislação, desde a edição da Lei 9.032/95, que a redução da capacidade laborativa passível de indenização é aquela oriunda de acidente de qualquer natureza ou causa, sendo este qualificado como o de origem traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos), que acarrete lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou temporária da capacidade laborativa.

Para um estudo detalhado do auxílio-acidente, seguem textos publicados no portal que irão acrescentar informações relevantes:

1) Traços jurídicos do benefício de auxílio-acidente

2) STJ – Tema 862 – Fixa o termo inicial do benefício de auxílio-acidente

3) Tema nº 315 da TNU – Da concessão do auxílio-acidente e da prescindibilidade do pedido de prorrogação

Mas qual a razão do aumento do número de concessões do benefício de auxílio-acidente?

De maneira geral, o incremento do número de beneficiários do auxílio-acidente vem ocorrendo em razão (i) da melhoria de registros dos acidentes do trabalho, bem como das identificações dos acidentes de qualquer natureza por meio da perícia oficial do INSS, (ii) da maior divulgação de informações sobre a proteção, o que cria um ambiente mais consciente no âmbito dos trabalhadores vinculados ao INSS, (iii) do processo de virtualização dos meios de requerimento, bem como da automação das rotinas de análise e concessão dos benefícios e (iv) da alteração dos precedentes judiciais, principalmente quanto aos critérios de concessão do benefício.

Na seara administrativa, o INSS trabalha com suas normas e regulamentos sobre a concessão do benefício de auxílio-acidente, o que exige a análise pelo perito médico federal e a constatação da existência ou não de redução da capacidade de trabalho quando a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza resultar em sequela definitiva para o segurado. Além disso, as sequelas deverão constar a lista referendada pelo Anexo III do Decreto nº 3.048/99.

Já na seara judicial, e aqui que entra uma questão importante do aumento do volume de concessões do benefício, foi construído um conceito de redução da capacidade laborativa mais amplo, abarcando situações antes não contempladas administrativamente.

Dentre os posicionamentos jurisprudenciais, destacam-se:

1) REDUÇÃO MÍNIMA: No Tema 416, o STJ definiu que “para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão”.

2) INTERPRETAÇÃO AMPLA DO CONCEITO DE REDUÇÃO DA CAPACIDADE: Algumas decisões têm considerado que a redução não precisa estar diretamente vinculada à atividade profissional desempenhada pelo segurado antes do acidente. Também existe precedente que reconhece que a incapacidade para atividades futuras também caracteriza redução da capacidade, considerando que o trabalhador pode não conseguir exercer funções em outras áreas no caso de mudança de profissão.

Em razão destes precedentes judiciais, é notório o aumento do volume de ações judiciais em face do INSS para a concessão do benefício de auxílio-acidente.

E, como não existe decadência quanto ao direito, apenas a prescrição das parcelas que antecedem os 5 (cinco) anos do ajuizamento da ação, o potencial de judicialização é grande, já que os trabalhadores (empregado, empregado doméstico – este a partir de 2015, trabalhadores avulso e seguradores especiais) que sofreram qualquer acidente e, tendo ou não gozado de auxílio por incapacidade temporária, apresentem redução da capacidade para o trabalho, estes podem se valer do processo judicial para pleitear o benefício.

Embora este fenômeno garanta a progressão do papel protetivo do sistema social de previdência, o impacto deste alargamento no número de concessões deve pressionar o orçamento do INSS, o que pode implicar em futuras medidas de contenção e até mesmo alterações legislativas das características do benefício de auxílio-acidente.

Texto produzido por Bruno Valente Ribeiro, coordenador do site O Guia Previdenciário, professor de direito previdenciário e Procurador Federal (AGU).

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